Um povo que tem o “mais-ou-menos”
como estilo de vida, não pode esperar um futuro excelente
Por: José Boas
Conversando
com meu amigo Vladmir (que hoje mora na Polônia) e meu tio Osvido, fui chamado
a prestar atenção em um traço cultural muito interessante, típico do povo
brasileiro: um amor quase doentio à imprecisão!
Sim,
somos um povo que ama ser impreciso; uma gente que adora tratar a vida com a
mesma responsabilidade com que um médico bêbado opera um tumor no cérebro de
seu paciente... e, se algo der errado dentro da roleta russa de nosso
algorarítimo de imprecisões múltiplas, “damos um jeitinho”.
Walt Disney foi cirúrgico ao descrever a cultura brasileira através de Zé Carioca: simpático, sem um emprego certo, sem nenhuma qualificação, malandro... |
Até
a nossa Constituição atual, a mais longeva de todo período republicano (das seis que o período já teve
até agora) vive de remendos, de “emendas”, de ajeitos, de arranjos... e há quem diga que
isso dá “maleabilidade” ao ordenamento jurídico nacional. Ora, se isso for
verdade, então o monstro de Frankenstein deve ser o protótipo do ser humano
ideal!
O
fato é que o concreto, o exato, a pontualidade, o mensurável... tudo isso
incomoda muito a índole do brasileiro médio. Quer ver um brasileiro típico
ficar chateado? Diga a ele que está atrasado cinco minutos para um evento ou um
encontro! Diga a ele que a medida certa é 99 cm e não 1m! Diga a ele que a
distância que precisa ser percorrida é de 3,4km e não de 3km... exija alguma
exatidão, algum esmero, algum refinamento.
Macunaíma, interpretado por nosso genial Grande Otelo... Mário de Andrade e sua antropologia cristalina e certeira |
O
ethos brasileiro é forjado no mais
fino macunaimismo! Cedo é entre as 06h e o meio-dia; depois é “tarde” até
anoitecer e, depois... é noite; as leis são cumpridas segundo as medidas, os
interesses e as interpretações de cada um; o espaço público não é de todos, mas
do governo... e como “governo” não é gente, e não sendo de ninguém, pode ser
depredado!
Um
povo que vive sob um regime assim, neste mais-ou-menos, não se profissionaliza,
não se qualifica, estranha a proposta de desejar ser o melhor em seu ramo... porque
tudo isso demanda trabalho, esforço, dedicação, empenho, frequência... nada
mais anti-Macunaíma; nada mais anti-malandragem; nada mais anti-jeitinho... um
povo que vive assim, jamais encontrará excelência em absolutamente nada, será
sempre amador, quebra-galho, mela-mão, o mexeriqueiro “faz-tudo”. Já o inverso
disso, o persistente, o profissional, o exigente, o preciso, o analítico, o
exato, o criterioso... esse é estranho, “caxias”, metido, chato.
Severino, o Quebra-galho... típico mal-formado, "pau-pra-toda-obra" que, por medo de perder seu emprego, se sujeita a qualquer atividade imposta por seu patrão |
O
mais estranho nisso tudo, no entanto, é que quando exigido desse mesmo povo uma
medida de qualidade, a referência é sempre uma outra cultura, um outro sistema
que, de alguma forma, respeita condutas e determinações como algo relevante: “ahhh,
mas nos Estados Unidos”; “olha, se estivéssemos no Japão...”; “Sabe, quando eu
estive na Alemanha”... Existem referências de precisão, mas elas são sempre
boas para os outros! Funcionam lá fora como se fosse por um tipo de energia
mágica, algo inatingível, embora desejável (mais
ou menos desejável, pois tamanha precisão, não sei não...).
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